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“TODOS OS SINAIS ESTAVAM LÁ DE PEQUENO”, DIZIA PAI DE JEFF, SERIAL KILLER DE "DAHMER"

Produção sobre assassino indica forte relação entre crueldade com animais na infância e início da violência contra pessoas

16/10/22

Sabrina Pires

"Dahmer: um canibal americano", série da Netflix baseada em fatos reais.

Jeff ainda é um menino e está na frente do rio onde tinha recolhido girinos para dar à professora. Contrariado pelo presente que não agradou, retorna ao local com o pote. Mas ao invés de devolver os animais ao rio, resolve colocar óleo de carro e assistir a morte dos bichos pelo vidro. A cena é uma entre tantas passagens da série “Dahmer - um canibal americano”, baseado em fatos reais. Em 10 episódios, a produção disponível na Netflix mostra o longo caminho do garoto que tinha particular interesse pelas entranhas de animais até se tornar o assassino em série que comia carne humana.


Estamos de volta à teoria do Link - tão comentada aqui pelo colunista do “E aí, bicho?” e estudioso do tema, Robis Nassaro. Num jargão bem simplório: quem maltrata bom sujeito não é. A teoria do Link estabelece a conexão entre pessoas que são cruéis com bichos e violência contra pessoas. Claro, não se trata de um episódio isolado na vida. Jeff gostava na infância, como mostra a série, de dissecar animais atropelados que recolhia na estrada. Tinha um prazer especial em ver a minhoca se debater no anzol. Situações incentivadas pelo pai que via com espanto e uma certa admiração a nada repulsiva coragem e interesse do filho com vísceras.


Isso tem a ver também com a vida de animais não valer nada, na visão da nossa sociedade. Na escola, na aula de anatomia, Jeff Dahmer tira o coração de dentro de um bebê porco (morto) para o espanto da colega ao lado. O professor endossa: “é ciência para entender o corpo humano” - mesmo não sendo um humano! Nessa altura, Jeff já sabe que esse é um bom alibi. E mais tarde quando esse mesmo jovem faz com pessoas o que fazia com animais, a desculpa já está lá: “essa serra é para cortar crânio de marmota”, “esse mau cheiro é um gambá morto”.


Mais tarde, quando tudo vem à tona, o pai de Jeff enxerga o passado: “todos os sinais estavam ali!”. Essa é a teoria do Link. Sinais que levantam bandeiras de atenção. São indicações para que se busque ajuda. Que se busque uma avaliação psicológica. Jeff tinha outro ponto forte no perfil apontado por esta teoria: o de famílias desestruturadas. Será que se alguém, algum professor, policial, mesmo o juiz que não atende ao apelo do pai, olhasse para aquele jovem de outra maneira que não fosse só o de julgar “que cara estranho” ou “que gosto bizarro” e tivesse procurado ajuda de fato, seria possível barrar tanto sofrimento?


Diante de uma das séries mais vistas na plataforma de streaming não dá para negar que de alguma maneira as pessoas querem entender o que leva alguém a ser tão macabro, dissecar corpos humanos e até comer partes das vítimas. A série é muito mais ampla, mas se há tanto interesse no resultado, talvez seja a hora de olhar com mais seriedade para inícios.

Sabrina Pires

Jornalista apaixonada por animais e natureza e criadora do "E aí, bicho?", espaço jornalístico que trata das relações entre bichos e humanos.


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