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CANNABIS MEDICINAL AVANÇA CONTRA PRECONCEITO E SE CONSOLIDA COMO TRATAMENTO VETERINÁRIO

Uso da planta como remédio não é solução para tudo, mas apresenta resultados positivos para diferentes doenças e condições.

22 de novembro de 2025 às 22:00:00

Por Sabrina Pires

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Produtos médicos a base de cannabis para animais / Imagem: Sabrina Pires

Produtos médicos a base de cannabis para animais / Imagem: Sabrina Pires

Maconha para pet? Dá barato no cachorro? Vicia? Tem que fumar? Essas são as perguntas mais frequentes quando surge a possibilidade de uso de Cannabis Sativa L. como medicamento. A resistência à estratégia terapêutica está associada aos mitos e símbolos que envolvem a planta na cultura atual. Na prática, é uma planta que possibilita tratamentos com respostas importantes, baixo efeito colateral e muito seguro. “São muito mais seguros que benzodiazepínicos e outras drogas”, defende Adrielly Toledo, médica-veterinária endocanabinologista. Isso porque os fitocanabinoides - substâncias produzidas pela planta - são similares àquelas produzidas pelo próprio corpo dos vertebrados, humanos incluídos. Ou seja, o organismo identifica e tem receptores que conversam com essas moléculas. E essa química promove equilíbrio.


Nós temos a Anandamida que é similar ao THC, presente na planta. Assim com 2AG é muito similar ao CBD. Então às vezes a gente acaba produzindo em pouca quantidade esses endocanabinóides (naturais do corpo) e a gente vai usar os fitocanabinóides (produzidos pela planta) para potencializar o sistema”, explica a médica-veterinária Letícia Fettback. “Todas as espécies se beneficiam com a cannabis, por isso que a gente trata do peixe ao elefante e o humano tá aí no meio também”.


Serve pra quê? - Estudos clínicos apontam respostas relevantes para cães que sofrem com dor, inflamação, epilepsia, questões articulares (osteoartrite), problemas de pele, questões neurológicas, tratamento para câncer e alterações comportamentais (estresse e agressividade), inclusive em cães em abrigos. Não resolve tudo, mas faz diferença.


Desde os anos de 1960, fala-se da Cannabis Sativa L. para fins medicinais. Aliás, muito tempo antes. Civilizações antigas, da Ásia, antes de Cristo, já usavam a planta para curar. O histórico de como a cannabis foi associada à uma substância perigosa tem a ver com causas sociais e outros interesses financeiros. Mas o fato é que nos anos de 1990, a ciência comprovou a existência do sistema endocanabinoide (SEC), um sistema regulador que ativa-se a partir das substâncias que o corpo - ou a planta, ou o laboratório - produzem. “Não é perigoso porque a gente tá potencializando um sistema que já é inerte em nós”, reitera Letícia Fettback. Ela ainda reforça que os ensaios científicos comprovam que a cannabis não vicia, mas pode gerar efeito colateral.


Os efeitos adversos mais comuns são sonolência, vômito, diarreia, e aumento de fosfatase alcalina (impacto no fígado). Em caso de acidente, o risco de uma overdose é zero. “No máximo, o indivíduo vai dormir, acordar com fome, com sede e a vida tá normal de novo”, comenta Letícia. Mais um motivo para que - como todo tratamento - tenha acompanhamento médico. No caso, médico-veterinário. Todo benefício vai depender da dose que precisa ser ajustada individualmente.

“Eu tinha meus bloqueios, mas diante do caso da minha cachorra que convulsiona fui procurar e hoje em dia não abro mão", Adrielly Toledo, médica-veterinária endocanabinologista

Polêmica - O conhecido THC (Tetrahidrocanabinol), por ter potencial efeito alucinógeno, causa polêmica no Brasil. Justamente a substância que no hipocampo tem a propriedade de aumentar a neurotrofina, proteína que auxilia na formação de novas células nervosas, ou seja, dispara a produção de neurônios já documentada em animais em laboratórios. Mas afinal, pode dar barato? “O efeito psicoativo é muito relacionado à combustão, então, quando se fuma existe o efeito psicoativo por conta da queima do THC, da degradação desse componente. Quando a gente utiliza por via oral ou por administração tópica esse efeito não é potencializado”, explica Adrielly Toledo.


Faltam estudos? - Um argumento recorrente de profissionais da saúde ainda é a suposta falta de estudos. Já foram publicados mais de 30 mil artigos científicos sobre o tema. Especificamente para uso veterinário o número é menor, ainda assim, há evidências comprovadas dos benefícios. “No Brasil nós já temos pesquisadores fazendo pesquisa em animais dentro de faculdades, já temos bastante trabalhos divulgados, então, esse argumento já não é mais válido e quando podia se falar isso, a gente esquecia que a maioria das pesquisas e trabalhos feitos para humanos eram em animais, só que (essa informação) não entrava em pauta”, avalia Fabio de San Juan, um dos pioneiros no uso de cannabis no atendimento veterinário, no Brasil.


Atualmente existe uma regulamentação que autoriza o médico-veterinário a prescrever produtos com as devidas licenças. “Hoje o preconceito é menor”, diz o diretor técnico da Associação Brasileira Pet Cannabis, “cinco, 10 anos atrás realmente a gente sofria preconceito, se você trabalhasse num hospital, numa clínica você poderia sim ser mandado embora por abordar esse tema com algum responsável ou tutor”, lembra San Juan.

A professora Eliana Rodrigues, da Unifesp, e criadora do curso MOVRECAM (Mov pela Regulamentação da Cannabis Medicinal) no Youtube - de graça - apresenta nas redes sociais pelo perfil @Canabinall estudos científicos sobre as descobertas e o que já se sabe no uso da cannabis medicinal. “Uma única dose do CBD a 4 mg/kg do cachorro duas horas antes de expô-lo a uma viagem de carro que pode ser estressante pra ele, diminui esse estresse. Para o cachorro e para quem está dirigindo”, mostra ela em um dos vídeos.


Sabemos também que o THC associado ao CBD pode ampliar essa atividade anticonvulsivante e novos estudos deverão se debruçar nessa possibilidade no futuro”, diz a professora em outra participação.


“Para os gatos, há pouca evidência científica sobre redução de dor, mas houve melhora na escala, no índice de dor usado pelos pesquisadores”, diz a professora em mais uma análise. “Para uso dermatológico em cães, em caso de dermatite atópica, a coceira melhorou e as lesões cutâneas também”, comenta em outro momento.


Onde obter? - A administração do óleo normalmente se dá duas vezes ao dia, algumas gotas. É diferente para cada animal. É preciso prescrição veterinária. Em geral, os primeiros sinais de melhora levam uma semana. O óleo full Spectrum costuma ter melhor resultado pelo chamado efeito comitiva que amplia os benefícios. Por enquanto, as associações fazem o papel principal que é extrair o óleo e permitir que esse animal tenha acesso à medicação.

Em 2025, o mercado de cannabis no Brasil (para humanos e animais) deve passar de 1 bilhão de reais. Em 2024, o número alcançou R$ 852 milhões, com impacto nos negócios de mais de mil empresas e associações. O potencial de pacientes beneficiados beira os sete milhões, segundo levantamento da Kaya Mind. Nos Estados Unidos, onde a lei permite todo tipo de produto a base de Cannabis Sativa L., há lojas especializadas em óleos, cremes, pomadas, e até comidas com base da planta para o mercado animal/veterinário.


“Eu tinha meus bloqueios, mas diante do caso da minha cachorra que convulsiona fui procurar e hoje em dia não abro mão. Eu falo que Cannabis é a evolução em terapia”, confessa Adrielly. A médica-veterinária lembra de um caso marcante, o do cachorro Leopoldo, que foi tratado apenas com o óleo de cannabis. Ela conta que o cão foi resgatado nas enchentes do Rio Grande do Sul, depois de passar 20 dias ilhado se equilibrando em uma das patas para não morrer afogado. “Ele tinha medo da água, e ele ia comer e ficava alternando as patas, esse animal tomou o óleo de cannabis por cerca de nove meses e teve 100% de remissão de sinais clínicos. É um caso que eu me emociono, isso permitiu a adoção desse animal e ele foi realmente adotado”, comemora.

Veterinária Adrielly Toledo e Leopoldo, animal tratado com cannabis medicinal. / Imagem: Arquivo pessoal

Veterinária Adrielly Toledo e Leopoldo, animal tratado com cannabis medicinal. / Imagem: Arquivo pessoal

Óleo de Cannabis Sativa L. usado de cachorro a peixe, de leão a tucano. / Imagem: Pexel

Óleo de Cannabis Sativa L. usado de cachorro a peixe, de leão a tucano. / Imagem: Pexel

Nos Estados Unidos, liberada venda de produtos a base de cannabis / Imagem: Sabrina Pires

Nos Estados Unidos, liberada venda de produtos a base de cannabis / Imagem: Sabrina Pires

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